segunda-feira, 17 de agosto de 2015

A ATUALIDADE DA EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DE JOHN LOCKE


 A EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DE JOHN LOCKE




Clenio Lago
(Brasil)

Graduado em Filosofia pela Unifra/RS, Mestre em Educação
pelo Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal de Santa Maria (PPGE/UFSM), no Brasil
Doutor em Educação pela PUC/RS.


     John Locke (1632-1704), filósofo empirista inglês, encontra-se na passagem do mundo medieval ao moderno, em um dos períodos mais turbulentos da história da Inglaterra, marcado pelo antagonismo entre a Coroa e o Parlamento, segundo Weffort (1991, p. 81), “[...] controlados, respectivamente, pela dinastia Stuart, defensora do absolutismo, e a burguesia ascendente, partidária do liberalismo”, do qual resultou o Estado Moderno, cujos reflexos se fizeram sentir nas mais variadas áreas, fazendo-se necessário para a compreensão do hoje.

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A origem das idéias e a educação

    Inicialmente, devemos considerar que Locke entende o homem como criatura de Deus, naturalmente livre e racional, dotado de capacidades inatas, cuja mente é “[...] um papel branco, desprovida de todos os caracteres, sem quaisquer idéias [...] quarto escuro [...] um armário totalmente vedado contra a luz [...]” (LOCKE, 1988 p. 27, 49 e 50); que o conhecimento é adquirido, a experiência (sensação/externa e a reflexão/interna) como a fonte de todo o conhecimento e o homem racional.

    Assim, ciente da vulnerabilidade da alma humana e do momento histórico vivido, imaginando que “[...] o espírito dos meninos toma este ou aquele caminho tão facilmente como a água” (LOCKE, 1988, p. 32), que o conhecimento se dá de fora para dentro9 e que o homem é pela educação recebida, mais que depressa, Locke buscou trabalhar com a sugestionabilidade humana, pois conforme Hernandes (1991, p. 44), “a força dos costumes, das opiniões difundidas é de tal porte, que é capaz de romper, até mesmo, um instinto natural, um dos mais altos e universais interesses do homem [...] a existência do instinto de autopreservação [...]”.

    Como os instintos naturais de autopreservação são insuficientes para fazer frente aos costumes e às opiniões alheias, buscou vincular a sensação e a reflexão e torná-las base do processo educativo, reforçando e negando os caracteres naturais, segundo o ideal a ser alcançado. Sendo a experiência sensível, a porta de entrada às idéias simples, aos materiais do conhecimento, ela constitui-se no primeiro momento tanto da ação cognitiva quanto da ação educativa. Mas, chamou a atenção de que a ação pedagógica deve ser conduzida com cuidado e com sabedoria, segundo o desenvolvimento natural da criança, proporcionando experiências em vista do fim: por um lado, salvando e desenvolvendo as disposições naturais voltadas para o bem e disciplinando-as; por outro, freando as inclinações para o mal e incutindo-lhes os referenciais da ação humana, uma vez que o caráter germina e frutifica em torno da experiência individual, com base na relação bem/prazer e mal/dor. Conforme Locke (1988, p. 45),

    As idéias, porém, que na realidade marcam inicialmente as impressões de modo profundo e permanente, são as que vêm acompanhadas pela dor e prazer. Uma vez que a principal tarefa dos sentidos consiste em fazer-nos observar tudo o que causa mágoa ou proveito ao corpo, coube à natureza ordenar com sabedoria, [...] que a apreensão de várias idéias deve ser acompanhada pela dor, preenchendo, desta maneira, o espaço para a ponderação e o raciocínio nas crianças.

    Estes, o prazer e a dor, na obra Alguns pensamento sobre a educação, Locke (1986, p. 80) os concebe como “[...] os ferrões que excitam a ação e como as rédeas que guiam o gênero humano inteiro”, pois, como afirma em outra passagem, “a única coisa que tememos, naturalmente, é a dor ou a privação do prazer” (LOCKE, 1986, p. 161). Assim, sendo as crianças muito sensíveis aos elogios e ao desprezo, ao prazer e à dor, a educação deve proporcionar, cuidadosamente, a inculcação de referenciais à vida virtuosa, associando prazer à felicidade e vício à infelicidade.10

    Para Jorge Filho (1992, p. 277-278), a proposta educacional de Locke
    [...] antes, cumpre sensibilizar a criança para um critério de reputação em sintonia com a lei de natureza, mesmo que divirja dos costumes sociais. A educação lockiana tem como propósito, não a adaptação a estes, mas a libertação de sua influência corruptora. [...] possibilitar a ascensão gradual da razão ao governo do entendimento e da vontade.

    Se as alterações ocorridas em nosso corpo não forem percebidas e não chegarem até a mente, não teremos a matéria do pensamento a ser trabalhada e relacionada, não existindo conhecimento e nem educação, pois tanto o processo do conhecimento quanto o educativo se dá de fora para dentro. Como Locke visa a formar o homem virtuoso, o gentleman apto a buscar o conhecimento e comportar-se como é devido em sociedade burguesa, valendo-se deste processo lógico, preferiu a educação doméstica, a fim de melhor proporcionar e controlar experiências positivas relacionadas ao prazer e negativas relacionadas à dor, em torno do ideal a ser formado, criando o desejo de ser virtuoso, pela canalização das vontades ao ideal de sociedade burguesa. Para tanto, apontou que a educação deve começar desde cedo, visto entender que a maior parte dos homens é pela educação recebida. O que está em jogo é a vulnerabilidade humana, pois

    Quando as crianças chegam ao mundo pela primeira vez, encontram-se rodeadas por uma infinidade de coisas novas, que, por constante solicitação de seus sentidos, orientam a mente constantemente para elas, avançando para observar de novo, e se deliciando com a variedade cambiante de objetos. São, assim, os primeiros anos usualmente empregados e entretidos em olhar para fora. [...] assim, crescendo com a atenção constante para as sensações externas, raramente os homens fazem alguma reflexão considerável sobre o que ocorre com eles, até atingirem a idade adulta; e alguns raramente, e mesmo jamais (LOCKE, 1988, p. 29).

    Como não nascemos adultos, como nossas capacidades não se encontram desenvolvidas e somos muito vulneráveis, Locke propõe a formação de “bons hábitos” como a forma mais eficaz do processo educativo, sempre considerando o desenvolvimento natural da criança. Segundo Hernandes (1991, p. 70), “a preferência de Locke pelo hábito resulta do seu reconhecimento acerca da inutilidade de pretender-se moldar a mente infantil recorrendo-se à explicitação e à memorização de regras e preceitos. [...] Contra a ineficácia das regras, temos a eficácia da prática” (grifo é da autoria). Ainda conforme Hernandes (1991, p. 86), para Locke, o hábito “[...] tem, na realidade, qualificação positiva quando ligado a questões práticas, disciplinares ou de eficiência, tanto física quanto mental. Entretanto, o hábito não desfruta, em Locke, de status teórico, epistemológico”. Sua importância está vinculada à ação prático-pedagógica, proporcionando a armadura necessária à busca do conhecimento e à conduta ética, à medida que determina subordinar à razão todas as opiniões e instintos, mas não sua sustentação, pois é carregado de irracionalidade.

    Enfim, tanto no processo do conhecimento como no educativo, Locke vale-se da mesma lógica. Ambos se dão de fora para dentro, com base nas experiências individuais que, na ação pedagógica, devem ser orientadas a moldar a mente e o caráter em vista de um padrão ideal de comportamento, através da instauração de bons hábitos. Por exemplo, o de subordinar tudo aos pressupostos da razão. Não esqueceu, porém, de chamar a atenção às disposições naturais, às individualidades, como que se desculpando de ter tratado a mente humana como uma tabula rasa.


4 comentários:

  1. Muito bom professor esse conteúdo, a teoria de Locke nos mostra muito sobre a educação, principalmente sobre a aquisição de conhecimento através das experiências.
    Daniela Carla S. Costa 2º período de Letras.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. O que Locke quer dizer sobre experiencia é que elas nos fornecem as ideias que habitam nossos pensamnetos

    Ariany Carvalho 2º Periodo de Letras Ingles

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  4. Em suma, Locke se apoia na tese de que as ideias humanas provém de experiências externas (Empirismo), outrossim, desprezando as ideias inatas defendidas pelo Racionalismo, tal qual o misticismo e a metafísica. Na educação, atesta que o mestre tem papel importante, já que, só através de sua intervenção os alunos chegarão ao conhecimento.

    Edvaldo Santos/Letras- Período II.

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